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Economia

Moçambique e a Promessa de um Futuro Energético Sustentável

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Moçambique encontra-se num momento decisivo da sua história energética. Com vastas reservas de gás natural e um dos maiores potenciais renováveis de África, o país ambiciona tornar-se um actor relevante na transição energética global. A meta é clara: atingir 100% de acesso à energia eléctrica até 2030 e, até 2050, tornar-se um modelo de economia de baixo carbono. Para tal, Moçambique precisa de equilibrar o aproveitamento dos seus recursos fósseis com investimentos firmes em fontes renováveis como a energia solar, eólica, hidroeléctrica e biomassa.

A transformação, no entanto, não se faz sem obstáculos. Infra-estruturas limitadas, custos elevados, atrasos em grandes projectos, e a necessidade de financiamento externo são desafios constantes. Ainda assim, entre 2023 e 2028, espera-se que 58% da nova capacidade de produção de energia venha de fontes renováveis, segundo dados da Electricidade de Moçambique (EDM).

Um país rico em recursos, pobre em acesso

Apesar do grande potencial energético, grande parte da população moçambicana continua sem acesso à rede eléctrica. Esta exclusão energética agrava as desigualdades sociais e limita o desenvolvimento de sectores vitais como saúde, educação e agricultura. A taxa de electrificação ainda está longe da meta de universalização, prevista na Estratégia Nacional de Electrificação aprovada em 2018.

Esta estratégia definiu como objectivo central o acesso universal à electricidade até 2030, estabelecendo metas ambiciosas e políticas de incentivo à diversificação da matriz energética. Paralelamente, a uniformização de tarifas e o seu ajustamento periódico visam garantir sustentabilidade e atrair mais investimento.

O potencial renovável moçambicano

A riqueza energética de Moçambique assenta em quatro pilares principais: energia hidroeléctrica, solar, eólica e biomassa. Cada uma dessas fontes representa uma oportunidade estratégica para diversificar a matriz energética e garantir segurança no abastecimento.

Energia Hidroeléctrica: Com um potencial estimado em mais de 12.000 MW — um dos maiores do continente africano — Moçambique destaca-se principalmente pelo aproveitamento do rio Zambeze, onde está localizada a Hidroeléctrica de Cahora Bassa. A central não só garante parte significativa do consumo interno como permite a exportação de electricidade para países vizinhos. A futura barragem de Mphanda Nkuwa, com capacidade prevista de 1.500 MW, promete reforçar essa posição e consolidar o país como fornecedor regional de energia.

Energia Solar: A radiação solar em Moçambique é elevada, e o país possui um potencial teórico superior a 20.000 GW. No entanto, apenas 2.7 GW são considerados tecnicamente viáveis para projectos actuais. Até o final de 2022, apenas cerca de 120 MW estavam em operação, sendo metade ligados à rede nacional. Este subaproveitamento reflete os desafios estruturais, mas também indica margem para crescimento exponencial.

Energia Eólica: O vento é outro recurso abundante. Estima-se que o potencial total ronde os 4.5 GW, com cerca de 25% dessa capacidade com possibilidade de ligação imediata à rede. O projecto em curso de uma central eólica de 120 MW em Namaacha, província de Maputo, é um exemplo dos primeiros passos no sector.

Biomassa: A biomassa, por sua vez, representa um potencial superior a 2 GW, especialmente com base em florestas produtivas. Um dos projectos em fase de concepção é a construção de uma bio-refinaria destinada à produção de biodiesel a partir de óleo de palma — uma alternativa sustentável que pode beneficiar regiões agrícolas e contribuir para a segurança energética rural.

Estratégia governamental: visão, metas e reformas

Moçambique tem vindo a estruturar o seu caminho energético com base em pilares estratégicos claros. A aprovação da Estratégia Nacional de Electrificação, aliada ao Plano Director de Infraestruturas Eléctricas 2018-2043, demonstra o compromisso do Estado com uma transição energética sustentável.

Este plano director prevê, entre outras metas, a integração de pelo menos 20% de renováveis na matriz energética nacional até 2043, com foco em soluções de menor custo e maior resiliência. O esforço para criar um ambiente legal e regulatório mais atrativo tem sido notório. Em Julho de 2022, o país actualizou a sua Lei da Electricidade, modernizando o quadro jurídico e destacando a importância do sector privado e das energias renováveis.

Além disso, foi lançado em 2020 o primeiro programa de leilões de energias renováveis, iniciativa que visa aumentar a transparência e competitividade na selecção de operadores e projectos.

O custo da transição: quanto custa tornar Moçambique mais verde?

A ambição energética de Moçambique tem um preço elevado. Para cumprir os compromissos climáticos e garantir uma transição justa e sustentável até 2050, o país necessita de um investimento acumulado na ordem dos 80 mil milhões de dólares americanos. Estes recursos serão aplicados em diversas frentes: expansão da rede eléctrica, construção de centrais renováveis, electrificação rural, reformas legais e capacitação institucional.

Este montante representa um desafio imenso para um país com orçamento limitado e profundas necessidades sociais. Por isso, o Governo e os seus parceiros estratégicos têm apostado em modelos de financiamento misto, que incluem fundos públicos, investimento directo estrangeiro, doações e linhas de crédito concessionais.

Uma parte considerável do financiamento será canalizada para infra-estruturas de transmissão e distribuição, com vista a reduzir perdas técnicas e garantir a integração eficiente de novas fontes renováveis. Outra fatia será destinada ao reforço institucional e legal, incluindo actualizações regulatórias que permitam mais flexibilidade e segurança jurídica para investidores privados.

Desafios práticos: da teoria à realidade

Apesar do potencial técnico e do enquadramento político, o país enfrenta uma série de desafios práticos que atrasam ou dificultam a implementação de projectos energéticos:

  • Infra-estruturas inadequadas, com redes de transporte limitadas ou obsoletas, que dificultam a integração de novas centrais;
  • Burocracia e morosidade nos processos de licenciamento, que afastam investidores e atrasam cronogramas;
  • Limitações técnicas e de mão-de-obra qualificada, sobretudo nas zonas rurais;
  • Conflitos armados em algumas regiões, como no norte do país, que comprometem a segurança de empreendimentos;
  • Dependência do financiamento externo, que por vezes está sujeito a agendas externas e instabilidade cambial.

Além disso, alguns projectos emblemáticos têm sofrido atrasos ou reconfigurações devido a mudanças nos mercados internacionais, disputas legais ou dificuldades logísticas. O exemplo mais emblemático é o de Mphanda Nkuwa, cuja viabilidade depende tanto da estabilidade macroeconómica nacional quanto da garantia de compradores externos.

A RENMOZ 2025 e a aposta em inovação

A decorrer nos dias 23 e 24 de Abril de 2025, na cidade de Maputo, a maior conferência do sector das energias renováveis, denominada Conferência de Negócios das Renováveis em Moçambique – RENMOZ, irá vai destacar o futuro sustentável e as oportunidades para acelerar a transição energética no País.

A conferência também irá explorar temas centrais como a construção de um sistema energético moderno sustentado por fontes renováveis, as possibilidades de investimento ligadas à industrialização verde, a incorporação de energias limpas no sector dos transportes e os esforços para assegurar o acesso universal a formas modernas de energia.

“O RENMOZ 2025 é muito mais do que um encontro anual, é o nosso compromisso partilhado de reafirmar Moçambique como um pólo central e catalisador das energias renováveis na região, construindo pontes estratégicas que ligam os desafios nacionais às oportunidades regionais e internacionais. Através desta plataforma, estamos a reforçar parcerias, a promover investimentos sustentáveis e a construir um futuro energético mais equitativo, inclusivo e resiliente, alinhado com os objectivos globais de energia e clima.” Afirmou Mayra Pereira, Presidente da Associação Lusófona de Energias Renováveis (ALER).

RENMOZ 2025 também aposta na cooperação internacional, com apoio de países como Alemanha, Suécia, Noruega e Japão, além de parcerias com o Banco Mundial e o Banco Africano de Desenvolvimento. A iniciativa procura alinhar os esforços de desenvolvimento com os compromissos internacionais do Acordo de Paris.

Perspectivas para o futuro: entre desafios e promessas

Moçambique tem diante de si a possibilidade de transformar a sua paisagem energética e social. A transição energética não é apenas uma resposta às mudanças climáticas, é também uma estratégia de inclusão social e de crescimento económico sustentável. Ao garantir energia limpa e acessível, o país pode promover o surgimento de novas indústrias, estimular a agricultura com irrigação eléctrica, melhorar os serviços de saúde e educação, e criar milhares de empregos verdes.

Entretanto, o sucesso dessa jornada depende de continuidade política, estabilidade económica e boa governação. O envolvimento activo das comunidades, o reforço da transparência nos processos de adjudicação de projectos, e a integração das energias renováveis na agenda nacional de desenvolvimento serão cruciais.

A transição energética é uma jornada de longo prazo, mas que exige decisões corajosas no presente. Moçambique tem os recursos naturais, o enquadramento legal e os parceiros certos para liderar em África uma nova era de energia sustentável. A sua capacidade de concretizar essa visão dependerá, em última instância, da vontade política, da inovação local e da inclusão de todos os moçambicanos neste processo transformador. (Lourenço Soares)

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