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Opinião

Vale a pena fazermos diálogos políticos?

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O falso consenso do diálogo político em Moçambique

“Eu não sei se é necessário fazer diálogo para acabar com o roubo de votos.”
— Fernando Chiure, jornalista moçambicano

Em Moçambique, o “diálogo político inclusivo” transformou-se num ritual estéril que não resolve nada. Os políticos que deviam fiscalizar o desempenho do Governo estão ocupados em reuniões pelas províncias, comendo do bom e do melhor, como diria Zeca Afonso no seu clássico, “bebendo o vinho novo e dançando arromba no pinhal do rei”. Multiplicam-se as reuniões, os comunicados e as fotografias, mas o país continua refém da fraude eleitoral e da falta de vontade política. Afinal, vale mesmo a pena fazermos diálogos?

A frase de Fernando Chiure é dura, mas certeira. E devia fazer corar muitos dos que vivem a repetir o mantra do “diálogo político inclusivo” como se fosse uma varinha mágica capaz de resolver todos os males de Moçambique. A verdade é que o país está cansado de diálogos que nada mudam, de encontros que terminam em comunicados de circunstância e de sorrisos forçados para a fotografia.

Em Moçambique, o diálogo tornou-se uma rotina política sem alma. Reúne-se, fala-se, promete-se e volta-se ao mesmo ponto: eleições contestadas, denúncias de fraude, mortos nas ruas e, no fim, o mesmo partido a declarar-se vencedor. É um ciclo viciado, onde o diálogo serve apenas para ganhar tempo e legitimar a manutenção do poder.

O problema central das nossas crises pós-eleitorais não é a falta de diálogo — é a falta de vontade política. Não há democracia possível quando o resultado eleitoral é decidido antes do voto, num recenseamento manipulado com estatísticas demográficas adulteradas. Não há confiança quando os órgãos eleitorais, incluindo a PGR, estão capturados, e quando o próprio Conselho Constitucional, que devia ser o garante da legalidade, é o primeiro a furtar-se dela. E não há paz duradoura enquanto a verdade das urnas for adulterada para satisfazer os interesses de quem já não sabe governar sem fraudar.

O diálogo, tal como tem sido conduzido — liderado pelo mesmo partido que governa sem legitimidade —, é um teatro caro. As mesas são largas, as palavras são bonitas, os financiadores internacionais aplaudem e, no final, tudo continua igual. Não há responsabilização, não há transparência, não há mudança. O povo, esse mesmo que sofre com a pobreza e a insegurança, é o único que não é ouvido.

Vale então a pena fazermos diálogos? Sim, mas só se forem verdadeiros. Só se servirem para reformar o sistema eleitoral, garantir a independência das instituições e punir quem rouba votos. Caso contrário, é melhor não perder tempo nem insultar a inteligência dos moçambicanos com reuniões que apenas alimentam a hipocrisia nacional.

Moçambique precisa de acção, não de mesas redondas. Precisa de coragem para dizer basta à fraude e à impunidade. Precisa de líderes que saibam ouvir o povo e não apenas os seus próprios interesses. Enquanto isso não acontecer, o diálogo continuará a ser uma farsa — um disfarce elegante para esconder o medo de mudar.

O caso da ANAMOLA, o recém-criado partido de VM7, diga-se sem rodeios, candidato que ganhou as eleições presidenciais nas urnas mas foi excluído do certame, é mais um exemplo gritante da selectividade e da manipulação do sistema. Quando até o direito de participar é condicionado pela conveniência política, o diálogo perde todo o sentido.

E é aqui que a provocação de Chiure faz todo o sentido: se o diálogo não é capaz de pôr fim ao roubo de votos, então ele serve para quê?

Talvez tenhamos chegado ao ponto em que é preciso menos conversa e mais verdade. Porque dialogar sem justiça é apenas prolongar a mentira.

Por Waka Afrika

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