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Sociedade

Gasolina a 300 meticais: Activistas protestam em vão e líder é preso

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A província de Nampula enfrenta, nas últimas semanas, uma acentuada crise de combustível que tem paralisado a mobilidade urbana e agravado os custos de vida. Durante o pico da escassez, a gasolina chegou a ser vendida a 300 meticais por litro no mercado negro, três vezes mais do que os 100 meticais praticados até meados de Abril.

A situação tem gerado um profundo mal-estar social, em particular entre operadores de táxi-mota, transportadores e trabalhadores informais, cujas actividades se tornaram insustentáveis. A realidade em postos de abastecimento tem sido marcada por longas filas, frustração e um sentimento crescente de abandono. Muitos automobilistas viram-se forçados a abandonar os seus veículos ou a reduzir drasticamente a sua circulação, numa cidade que já enfrenta limitações severas de transporte público. Apesar do impacto visível e das reclamações recorrentes dos cidadãos, o governo provincial de Nampula mantém-se em silêncio.

Questionados em diversas ocasiões pela imprensa local, tanto o governador Eduardo Abdula como o secretário de Estado Plácido Nerino Pereira recusaram-se a pronunciar-se, alegando que a matéria é da alçada nacional. O presidente do Conselho Autárquico de Nampula, Luís Giquira, limitou-se a expressar “preocupação”, sem apresentar medidas concretas. Uma postura idêntica foi adoptada por Filipe Paúnde, membro da Comissão Política da Frelimo, durante a sua recente visita à província.

Tentativa de protesto silenciada

Face à inércia das autoridades, um grupo de activistas sociais e defensores de direitos humanos, liderado por Gamito dos Santos Carlos, decidiu convocar uma marcha pacífica no sábado, 10 de Maio, com o intuito de exigir respostas concretas e responsabilização política. A organização da marcha seguiu os trâmites legais: cartas foram submetidas ao Comando Provincial da Polícia da República de Moçambique e ao Município de Nampula, detalhando o itinerário e o objectivo do protesto. No entanto, os organizadores não obtiveram qualquer resposta formal até ao dia da manifestação, em violação clara do artigo 51 da Constituição da República, que consagra o direito à liberdade de reunião e manifestação.

Sem uma proibição formal, os organizadores decidiram avançar com a concentração, mas foram rapidamente confrontados por um aparato policial fortemente armado. Diante da presença intimidatória, e para evitar confrontos, Gamito dos Santos ordenou ao grupo que se dispersasse.

“Decidimos cancelar a passeata nas ruas, mas o simples facto de estarmos aqui já é uma forma de manifestação. Queríamos apenas reclamar os nossos direitos e alertar o governo para a insustentabilidade do preço do combustível”, afirmou à imprensa no local.

Detenção arbitrária e agressões

Minutos após a dispersão pacífica, Gamito dos Santos foi seguido por uma viatura identificada como pertencente ao Comando Distrital da PRM. O activista, ao confrontar os agentes para exigir explicações, foi surpreendido por uma ordem de detenção sumária.

“Pediram-me para entrar na viatura e, quando questionei com base na lei, fui brutalmente agredido por cerca de dez agentes que saíram do Mahindra”, relatou.

Gamito foi conduzido à 1.ª Esquadra da PRM de Nampula, onde afirma ter continuado a ser maltratado fisicamente. Segundo ele, os agentes evitaram abrir um auto formal de notícia, conscientes de que a detenção não tinha respaldo legal.

“Três horas depois, fui libertado sem qualquer acusação, mas saí com ferimentos num dos pés e no braço”, afirmou, acrescentando que pretende processar judicialmente os agentes responsáveis. O caso reacende o debate sobre a repressão ao direito à manifestação e à liberdade de expressão em Moçambique, especialmente em contextos onde a população exige respostas diante de crises sociais.

O silêncio das autoridades, somado ao uso desproporcional da força contra cidadãos pacíficos, revela uma tendência preocupante de criminalização da cidadãnia activa.

Enquanto a crise de combustível continua sem explicações claras, cresce o descontentamento nas ruas de Nampula. Para muitos, a detenção de Gamito dos Santos simboliza mais do que a repressão a uma marcha — é o retrato de um Estado que, diante da dor colectiva, prefere silenciar vozes do que resolver os problemas que as originam.

Por Agostinho Miguel

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